Sombart, por Tristão de Athayde

Sombart, por Tristão de Athayde

Introdução: O texto de hoje consiste em ensaio de altíssima erudição de Alceu Amoroso Lima sobre Werner Sombart. Estudo histórico fundamental àqueles que se interessam pelos movimentos de século tão conturbado quando o sec. XX. Alceu trata aqui de distinguir duas figuras que, durante muito tempo em nossas letras, permaneceu igualada enquanto “críticos do capitalismo”—Marx e Sombart. 

Alceu Amoroso Lima, no fim do texto, imita o costume brasileiro de retorno às letras francesas realizando fato lamentável, o de comparar Bergson com Sombart. Além disso, acredito que por falta de documentação, Alceu deixa passar um detalhe de fundamental importância para o estudante da história econômica: muito antes de Sombart, Böhm-Bawerk já havia enfatizado a categoria do Tempo, em “Zum Abschluss des Marxschen Systems” (1896).

Hoje lamentamos o fato de estar Alceu Amoroso Lima literariamente morto. Esse líder católico caiu em esquecimento, mesmo tendo sido um dos principais militantes contra o período militar, contra os regimes totalitaristas. Nada se fala deste homem e sequer reeditam suas obras primas. A escolha por deixar a ortografia dos anos 30 intacta (com imediata mudança ortográfica na segunda parte do artigo) é proposital. O ensaio de hoje é uma re-lembrança ao público do que este país já teve em abundância: intelectuais.

Sombart

por Tristão de Athayde

Diario de Pernambuco, 8 de Junho de 1941.

Parte I 

Quando, em 1867, publicava Karl Marx o primeiro volume do seu livro duplamente capital para os atuaes destinos da humanidade, tinha apenas quatro annos esse outro grande economista e sociológico allemão, Werner Sombart, que acaba de fallecer. Não é accidental a approximação que ora faço entre essas duas figuras da história social do mundo moderno. Succedendo uma à outra no tempo, também de certo modo se collocam, na evolução das idéias, como expressões ou mesmo symbolos de duas phases successivas da história de nossos tempos. Summariando, por antecipação, podemos dizer que um ponto os ligou profundamente e outro profundamente os colocou em polos opostos. O ponto de união entre os dois é a inserção do Economico no Social. O ponto de oposição é a medida do valor por ambos adoptada—para Marx a Technica; para Sombart o Espirito

A Economia Política da escola classica, que Marx encontrou como dominante ainda em seu tempo, era uma economia ainda de tendencia à abstração scientifica; procurava as leis naturaes que governam os phenomenos economicos; isolava esses phenomenos quanto possivel do conjunto dos demais phenomenos sociais e aceitava a ordem politica estabelecia como expressão da maior felicidade social.

Essas tendencias da escola classica, que levavam a Economia Politica a uma abstração crescente, despertaram uma dupla reação de certos autores que podemos collocar nas origens dessa corrente economico-sociologica que iria dar, no decorrer do seculo XIX, dois pensadores de tão grande importancia, para os nossos tempos, como Marx e Sombart. Essa dupla reação foi a dos historicos e a dos socialistas. Na Inglaterra e na Allemanha começou um movimento no sentido de investigar os problemas economicos à luz da historia. Richard Jones observou, na Inglaterra, a limitação do campo de observações de Ricardo e empreendeu o estudo da economia em outras terras e outros tempos. O mesmo fizeram Sismondi e John Rac, e, na Allemanha, a escola historica com Roscher, Knies, e sobretudo List, cujas proprias obras de caracter historico, popular e nacional iam operar, em materia economica, no mesmo sentido que as obras de Savigny no terreno do Direito ou a de Herder no terreno da Literatura. Esse historicismo, que deixava as preoccupações de systematização scientifica para alargar o campo de observação dos dados de fato,—vinha coincidir com os primordios do movimento socialista, com Robert Owen, William Thompson, Saint Simon e Fourier. Se o historicismo lançava os olhos para o passado, despercebido pelos “classicos”,—tinha o socialismo olhar para as classes trabalhadoras, tambem por elles desconsideradas. Incorporavam-se à Economia Politica, de caracter scientifico, dos campos de visão até então desconhecidos,—o passado economico da humanidade ou a economia dos povos exoticos e a condição real e desastrosa das classes inferiores da sociedade, depois da Revolução Industrial. 

Tudo isso, porém, se fazia de modo esparso, superficial e sem rigor systematico. Karl Marx tentou a syntese das tres correntes—a scientifica de Ricardo, Malthus e Smith, a historica de List ou Sismondi e a socialista utopica de Owen ou Saint Simon. O cimento com que tentou articular as partes esparsas de sua construcção foi a philosophia de Hegel, deslocada com Feuerbach para o campo do monismo materialista. A arma com que empreendeu a incarnação historica de sua Economia Militante foi a Revolução. E a classe a que entregou a tarefa de realizar a Nova Egira foi o Proletariado. Dahi [daí], nasceu o Materialismo Dialetico e a vaga Marxista, que assistindo, com o mallogro universal do marxismo. 

Quando Sombart nasceu estava Marx, portanto, no apogeu de sua carreira de scientista e de agitador, embora lutando contra o espirito do seculo XIX, que se desenvolvia no sentido liberal e optimista e não social e pessimista, como ia ser o seu evangelho revolucionario. 

Entre os novos conceitos que a economia-sociologica dos socialistas introduzira no campo da economia classica, estava de Capitalismo. “A expressão Capitalismo, segundo sua origem, não é um conceito scientifico e sim uma fórmula politica… Deriva originalmente da critica socialista à sociedade… E assim, segundo a sua origem, pode-se definir o capitalismo com' a constituição economica existente, vista através dos oculos do socialismo” (L. Pohle—Kapitalismus, in “Handworterbuch der Staatswissenschaftten”, V, pg. 584).

Foi em França que pela primeira vez appareceu a expressão, no sentido actual, e parece, segundo as pesquizas de Passow, que Louis Blanc foi seu autor, no livro “Organisation du Travail”. Eis como se exprime o agitador francez:—“On voit en quoi consiste le sophisme qui sert de base à tous les raisonnements de M. Bastiat. Ce sophisme consiste à confondre perpétuellement l’utilité du capital avec ce que j’áppellerat le capitalisme; c’est a dire l’appropriation du capital par le uns, à l’exclusion des autres [Vemos então em que consiste o sofisma que serve de base a todos os raciocínios do Sr. Bastiat. Esse sofisma consiste em confundir perpetuamente a utilidade do capital com o que chamarei de capitalismo: isto é, a apropriação do capital por alguns, com a exclusão de outros]” (cit. por Richard Passow—Kapitalismus, 2ª ed. 1927, pg. 2).

Passow e Pohle, como todos os historiadores do phenomeno, mostram que Marx foi o introdutor do termo na economia systematica, embora nunca fale em capitalismo e sempre em “modo de producção capitalista” (Kapitalistiche Produktionsweise). Tres annos depois do apparecimento dos “Das Kapital” já publicava Schafle, em 1870, um volume sobre “Kapitalismus und Sozialismus” e desde então poucas expressões terão occupado, de modo tão frequente e em sentidos tão variados, a attenção do mundo moderno. 

Foi justamente o phenomeno capitalista que constituiu o elemento de ligação e de transição entre Karl Marx e Werner Sombart. É o proprio Sombart, no prefacio com que abre o 3.º volume do seu livro fundamental sobre “Der Moderne Kapitalismus” (1ª ed. 1916), onde estuda o periodo de plenitude do capitalismo, “Das Wirtschaftsleben im Zeitalter der Hoch-Kapitalismus” (1ª ed. 1927)—que estabelece os laços que o prendem a Marx e os motivos que delle radicalmente o separam, todos em torno do problema do Capitalismo.—“Esta obra outra coisa não quer ser senão a continuação e de certo modo a plenitude (Vollendung) da obra de Marx… Com a sua genial problematica mostrou elle à sciencia economica, por um seculo, os caminhos da pesquisa profunda” (op. cit. pag. XIX).

Colloca-se, pois, Sombart na propria linha de Karl Marx, isto é, na da vitalização da economia pela sua deslocação do terreno das abstrações especulativas para o da realidade historica e humana. Apenas, a posição em que Sombart se coloca em face do Capitalismo é completamente opposta à de Marx. Ao passo que este, como lembra o proprio autor dessa extraordinaria syntese do Socialismo que são os dois memoraveis volumes do “Der Proletarische Sozialismus” (10ª ed. refundida 1925)—quando Marx iniciou a sua obra, por volta de 1840, achava-se perante o Capitalismo no inicio de sua victoriosa expansão pelo mundo, ao passo que Sombart se encontrava em face do declinio do Capitalismo. Marx foi um admirador extremo, como aliás o seu successor Lenin, da obra do capitalismo. Embora Marx tivesse, num momento de objectividade e justiça historica, chamado o fim da Idade Média, “a idade de ouro do trabalhador rural”,—nunca escondeu que o “Capitalismo, na evolução economica da humanidade, era uma phase de progresso intrinseco sobre o ‘Medievalismo’”. E como, para seu materialismo dialetico, as phases da historia succedem sem possibilidade de qualquer volta,—o espirito é para elle funcção da technica e esta segue uma linha continua de evolução progressiva, e toda volta ao espirito de outra idade anterior é um contrasenso e uma contradição à marcha natural das coisas, à luz do marxismo. 

É o erro do conceito genético-evolucionista dos acontecimentos, contra o qual a philosophia existencialista, na propria Allemanha, se ergueu de modo completo e systematico. 

Sombart se colloca, em face do Capitalismo, não na attitude positiva de Marx e sim numa attitude negativa. Ou, como elle proprio o diz:

“Marx se collocou em face de tudo o que é essencial no Capitalismo, como até hoje não tem sido bem accentuado, em attitude francamente positiva, affirmativa… Nós porém não podemos mais crer na força criadora do Capitalismo, como Marx o póde, pois se collocava no começo do caminho. Nós sabemos que, no seu todo e em linhas geraes, nenhum grande valor cultural delle (Capitalismo) nos veiu e que tambem de futuro nada ha-de provir. Certamente, não precisamos, para isso, ser “kultur pessimisten”, não precisamos desesperar do futuro da humanidade. O que precisamos é assentar o nosso optimismo em qualquer outra parte que não no circulo das idéias derivadas do mundo capitalista…  Resumindo, podemos dizer que Marx disse a primeira grande palavra sobre o Capitalismo e nesta obra vamos dizer a última palavra modesta sobre esse systema economico” (op; cit. p. XXIII).

Em summa, Marx admirou o Capitalismo como um élo necessario do Progresso e condemnou-o apenas como um socialismo empirico e uma economia arbitrria e anachronica. Ao passo que Sombart rejeitou-o formalmente como um systema philosophicamente errado e sociologicamente infecundo. 

E que pretendeu então o grande economista allemão collocar no logar dessa economia baseada na hypertrophia do instincto do lucro e de expansão dynamica do individuo?

O humanismo economico, a economia limitada e organica e no fim da vida, hélas, já contaminado pelo nacionalismo irradiante da Nova Allemanha, e do Nazismo,—o que elle chamou, como já o chamara Moeller van den Bruck, o propheta do IIIº Reich,—o “Deutscher Sozialismus”.

Já nos seus admiraveis estudos sobre o capitalismo, espinha dorsal de sua grande e variada obra economico-sociologica, tinha acentuado Sombart importancia fundamental do elemento espiritual na conceituação do phenomeno economico contra o materialismo marxista. Ao traçar, no volume inicial de sua obra prima, o sentido geral de suas pesquizas, mostrou como foi buscar em Goethe o elemento Espirito (Geist), como sendo o elemento central de todo conhecimento, inclusive o economico. 

“Meu primeiro cuidado foi procurar e acompanhar na sua atuação o Espirito que dominou uma determinada época economica e segundo o qual foi conformada a vida economica dessa época. É um pensamento fundamental deste tratado que em differentes épocas, dominaram differentes mentalidades economicas (Wirtschaftgesinnungen)”. (“Der Moderne Kapitalismus”, 6ª ed. vol. 1, pag. 245).

Contra essa acentuação da primazia do espirito, na configuração dos phenomenos economicos, levantou-se naturalmente toda a turma dos technologistas e naturalistas que em 1920 assim se exprimiam pela voz de Diehl: “Não foi o espirito de egoismo, nem o instincto do poder ou da iniciativa que criaram o capitalismo. Esses momentos subjectivos desempenharam papel importante na vida economica, mas só factores concretos, technicos e sociaes é que produziram o que se quer compreender por capitalismo” (in “Schmollers Jahrbuch”. 44º anno, fls. 810, cf. Pohle).

Era essa justamente a these marxista e geralmente a de todo naturalismo economico. Sombart vinha collocar-se exatamente no polo opposto. E é por isso que a seu respeito podemos falar de humanismo ou melhor de culturalismo economico. Discipulo de Schmoller, proseguiu Sombart na linha iniciada pela escola historica. A philosophia do romantismo allemão e particularmente a de Hegel e Schelling influiu decisivamente em seu espirito. Ao materialismo economico de Marx, veiu oppor o idealismo economico. O espirito e o tempo foram dados fundamentaes de sua philosophia economica da historia. Menos do que um systema economico novo, veiu inserir suas idéias na corrente de uma evolução, no sentido fiel das tendencias hegelianas. E assim como Benedetto Croce, coripheu italiano do neo-hegelianismo, iria affirmar que a philosophia não era mais do que a somma dos systemas philosophicos, concebendo a philosophia não mais como uma Metaphisica, mas como uma Metodologia ("La philosophia… non puó essere necessiariamente autro che il momento metodologico della Storiographia”—B. Croce—Theoria e Storia della Storiographia. 2ª ed. 1920, p. 136), identificando assim Philosophia e Historia—tambem elle iria escrever que—“a economia politica não é mais do que a doutrina dos systemas economicos” (“Der Moderne Kapitalismus”, op. cit. vol. I, pgs, 21). O historicismo idealista está na base dessa consideração philosophica da economia. Nem a Economia ontologica, nem a Economia normativa, e sim o primado da historia e das posições psychologicas, sobre o determinismo naturalista, tanto da economia classica como do socialismo racionalista.

Elle mesmo mostrou o contraste entre a posição que adoptava e a dos demais systemas economicos, no seu livro “Die drei Nationaloekonomien” (Duncker & Humblot, 1930).

Começou por mostrar o caos existente em matéria economica, como aliás em materia philosophica. “Essa é uma propriedade que a Economia não partilha com nenhuma outra sciencia, a não ser a philosophia: a de não se saber em que ponto do globus intellectualis se encontra” (op. cit. fl. 1).

Existe realmente, no mundo actual, um cepticismo generalizado em materia economica. Ha seculo e meio que nasceu, no Occidente, essa jovem science. Vinha, como sempre que nasce uma sciencia nova, cheia de esperanças e de illusões. Mesmo depois dos grandes golpes que lhe acenaram espiritos systematicos como Marx ou Comte, tentara ultimamente uma forte reacção, mathematico-scientifica e julgara ter attingido, com o chamado marginalismo, um planalto de segurança absoluta. E, no entanto, a realidade, mais uma vez, transbordou de todos os conceitos. E assim como a Sociologia, a que ha um seculo Augusto Comte prediziu um futuro scientifico inabalavel, como teria de ser o de uma “physica social”, é hoje em dia até negada em sua existencia, por pensadores da amplitude phillosophica de um Marx Scheler.—tambem a Economia, ao cabo de seculo e meio de pesquizas, se encontrava à procura do seu proprio lugar, no quadro das sciencias humanas ou naturaes! E o que mais é—desconsiderada nos dominios da cultura e mesmo… da incultura. O povo de hoje não crê nos economistas ou financeiros. Está de novo na phase perigosa de um positivismo empirico, que leva à indiferença ou ao cynismo. E contra o qual é mister lutar em nome da verdadeira Sciencia; à força de terem querido pensar os valores sociaes uma “certeza” scientifica que não poderia passar,—já o dissera ha seculos o genio do Aquinate de uma “probabilidade conjectural”,—viam-se os economistas, doutrinarios e praticos, perante uma tal contradição entre a sciencia e a realidade, que realmente só poderia degenerar no cepticismo que hoje lavra a tal respeito por toda parte. E, com isso, abrindo a opportunidade a todas as aventuras politicas e philosophicas, desde o materialismo dialectico do Communismo ou a economia racista do nazismo, até o mais deslavado pragmatismo do dia a dia. Esse cepticismo economico já fôra aliás expresso por Benedetto Croce nos principios deste seculo (1908):—“Or se si considerano le azioni economiche con mente sgombra di pregiudizi, seguendole e cogliendo le nella loro incontaminata e indunnuta realtá, torna impossible stabilire nemmeno um solo (sic) dei concetti de delle leggi che la scienza economica pone e fé accettare [Agora, se se considera a ação econômica com uma mente livre de preconceitos, seguindo e captando-a em sua realidade incontaminada e indubitável, torna-se impossível estabelecer um só (sic) dos conceitos e leis que a ciência econômica estabelece e nos faz aceitar]”. (B. Croce, Filosofia della pratica. 2.ª ed., 1915, p. 254).

Sombart, que era um espirito essencialmente philosophico e tudo via sub specie universalitatis, procurou uma ordem no chaos a que attingiram os systemas economicos. E verificou então que todos elles assentavam em raizes phillosophicas e que estas se distribuiam por tres sectores, “drei und nur drei”:—“o metaphysico, o scientifico-natural (naturwissenschaftliche) e o scientifico-espiritual (geistwissenschaftliche)”.  No conjunto dos systemas economicos, tanto do passado como do presente, já encontrava Sombart tres attitudes possiveis: “a normativa (richtende), a ordinal (ordnende) e a compreensiva (verstehende)” (op. cit. p. 19).

A primeira é a dos que subordinam os valores economicos e valores ideais, de uma perfeição a attingir, e compreende não só os pre-escolasticos, os escolasticos e os neo-escolasticos (de Aristoteles a Othmar Spann); mas ainda os “harmonistas”, que compreende os physiocratas e liberaes a partir do seculo XVIII, os socialistas, e os racionalistas, como todos os partidarios do chamado “jusnaturalismo”.

A “economia ordinal” é a que procura basear a sciencia economica nas sciencias naturaes. Nasceu da ruptura da unidade cultural européa, a partir do Renascimento, desde quando o homem se tornou de novo a medida de todas as coisas. Ou, como dizia Leon Batista Alberti, citado por Sombart: “Os homens tudo podem por si, desde que o queiram”. A esse phenomeno—tão característico da aurora do mundo moderno e do qual ia nascer, segundo Sombart, o Capitalismo Moderno,—chama-o de “secularização do estylo da vida”, isto é, “a deslocação do angulo de visão dos valores eternos para as coisas deste mundo, a secularização da vontade e dos valores” (op. cit. p. 85). Todos os systemas economicos baseados na “sciencia secularizada”—conceito que então surge no Occidente e que um Augusto Comte viria a tomar, no seculo XIX, como o da Sciencia em si (e nisso está uma das illusões que explicam o malogro scientifico e social do Positivismo)—visaram desde então erigir a Economia em sciencia autonoma e independente. Numerosos traços da economia “classica” participam dessa tendencia abstrativa, da sciencia economica, que vae dos “mercantilistas” até os “marginalistas” e a economia mathematica de nossos dias. É a Economia que procura as leis ontologicas da vida economica e é representada por figuras como Stuart Mill, Cournot, J. B. Say, Pareto ou Schumpeter. 

A essas duas correntes vem sommar-se a da “kulturwissenschaftliche Nationalokonomie”, que se desenvoleu a partir da Escola Historica e que ia encontrar o seu grande philosopho na figura de Wilhelm Dilthey. A partir deste último e do jurista Rudolph Stammler, que introduziu o methodo cultural-scientifico no estudo do Direito, ia desenvolver-se no seculo XX toda uma linhagem de pensadores, como Heinrich Maier, Theodor Litt, Max Scheler, Eduard Spranger, todos integrados na mesma corrente de idéias que parte da distinção entre “Naturwissenschaften” e “Geistenwissenschaften” e vieram portanto derrubar a supremacia, a idolatria e mesmo o monopolio das “Naturwissenschaft” que o naturalismo e o positivismo haviam tentado instaurar no seculo XIX. 


Parte II 

Diario de Pernambuco, 22 de Junho de 1941. (N. E.: Vemos já a mudança de ortografia)

Sombart, como vimos, intentou uma reação contra a unilateralização da economia social.

Desde 1907, num pequeno trabalho sobre a obra de Marx (“Das Lebenswerk von Karl Marx”) integrou a ciência econômica na corrente das idéias culturalistas.

Outro grandes economistas o acompanharam, como von Gottl, Othmar Spann, ou Max Weber, além de alguns de renome mais limitado.

A Economia é, pois, para Sombart, uma ciência experimental (e não dedutiva); uma ciência cultural (e não natural); uma ciência social (e não puramente econômica). Chega ao ponto de fundir a economia na sociologia, negando a existência de fatores econômicos isentos de valor social e de participação profunda nos valores sociológicos. “É falso falar de correntes “econômicas e sociológicas”... A Economia é por assim dizer Sociologia, isto é, uma ciência da convivência humana. Não existe em nossa ciência um dominio do “econômico”, de que se pudesse tratar independente do social” (“Die Drei Nationalöconomien”, p. 177).

Partindo desse ponto de vista cultural, chega Sombart a uma posição nitidamente relativista e aristocrática, em matéria econômica. Não ha uma Economia Política, como ha uma Física. Ha tantas Economias Politicas quantas as épocas culturais da humanidade. Demais, a Economia, para êle longe de ser uma ciência utilitária, é como todas as ciências culturais, um “Luxus”. As ciências culturais, entre as quais a Economia,—sociólogicamente falando costituem a expressão do único aristocratismo de que foi capaz a cultura burguêsa e por isso talvez venham a desaparecer com essa cultura: numa terra como a Russia Soviética já não ha lugar para elas” (op. cit. p. 341).

A incerteza da posição filosófica de Werner Sombart—que a despeito de sua profunda inclinação pela filosofia perene nunca saiu de um neo-hegelianismo mais ou menos panteista—leva-o a resultados francamente contestaveis. Leva-o a uma especie de diletantismo cultural, que explica porventura a pouca popularidade de que gozou entre os seus próprios patrícios, (como se vê da posição secundária em que o coloca o seu rival e adversário, Franz Oppenheimer, num balanço que fez, em 1928, da moderna sociologia alemã: Franz Oppenheimer—Richtungen der neueren deutschen Soziologie1928, p. 14), ou entre os economistas e sociólogos contemporâneos, a despeito de sua obra realmente extraordinária, tanto pelas verdades gerais de sua concepção econômico-social e pela riqueza assombrosa da erudição, como pela vida com que soube animar e a beleza literária com que soube exprimir e realizar esse seu grandioso monumento econômico-sociólogico, porventura o mais sedutor de nossos tempos. 

Sombart sempre foi nitidamente germânico, no seu espirito e na sua obra. Durante a última guerra colocou a sua pena combativa e luminosa contra o Império Britânico escrevendo um livro em que confrontava o espirito nobre dos alemães contra o espirito comercial dos inglêses (“Händle und Helden”, 1.ª ed. 1915). 

Essa oposição se tornou um “slogan”, no povo alemão e particularmente entre os seus dirigentes atuais e lhe tem valido algumas desilusões, a partir de Junho de 1940 e talvez lhe venha a custar arrependimentos ainda maiores… 

Com a “depressão” da derrota dedicou-se Sombart à sua grande obra sobre as origens, o esplendor e a decadência do Capitalismo. E sobre o estudo do elemento judáico do Capitalismo, que ficou sendo para muitos e mesmo para grandes historiadores modernos das idéias econômicas, o único mérito de sua obra imensa (cf. Edmund Whittaker—A history of economic ideas. Longmans, Green & Cie., 1940, p. 89). Foi no seu livro “Die Juden und das Wirtschaftsleben” (1.ª. ed. 1911) que Sombart estudou o papel decisivo dos Judeus na formação do Capitalismo Moderno, como Max Weber estudou, no mesmo sentido, o papel do Calvinismo. Em outro grande livro, “Der Bourgeois” (1.ª ed. 1913), estudou a formação do “novo tipo de homem”, nascido dos tempos modernos do homem secularizado, vindo daquela ruptura da unidade cultural do Ocidente e daquele “secularização do estilo da vida”, com que começaram os tempos atuais e a organização da moderna vida econômica. No “Der Proletarische Sozialismus”, a que já nos referimos, deu-nos o maior e melhor balanço que conheço das numerosas correntes socialistas de todos os tempos e particularmente dos séculos XIX e XX. 

Com o desenvolvimento crescente do socialismo nacionalista na Allemanha, Sombart—que se apresentava como um “continuador” de Marx e, ao mesmo tempo, como um adversário radical do seu materialismo e do seu cosmopolitismo—atirou-se naquilo a que chamou de “Socialismo alemão”. Foi Moeller van der Bruck, o malogrado precursor do nacional-socialismo, que lançou, profeticamente, na Alemanha marxista; ou democrática de Rathenau, Stresemann ou Brünning, o “Schlagwort” do socialismo nacionalista. “Jedes Volk hat seinen eigenen Sozialismus”, cada povo tem o seu próprio socialismo, exclamou êle repetidamente, naquele seu estilo apostólico e profético, que tinha alguma coisa do estilo de Péguy, em França (“Das Dritte Reich”, 3.ª ed. p. 65).

Esse “socialismo alemão”, que Sombart faz remontar até Platão (sic) (cf. Socialisme Allemand. Une Théorie nouvelle de la societé—trad franc. Paiot, 1938 pg. 140)—foi obra na Alemanha de uma corrente que vinha de Lorenz von Stein, de Rodbertus, de Lassalle, de Schäffle, etc., e foi no período pre-hitleriano pregado por esse ex-amigo e hoje inimigo mortal de Hitler, refugiado no Canadá—Otto Strasser, no seu livro “Der Aufbau der deutschen Sozialismus” (1932) e pelo grupo de jovens revolucionários nacionais chamado “Tat” (A ação).

Sombart resumia sua psicologia do povo alemão num evangelho do activismo repetindo a palavra famosa de Fichte: “Agir, agir, para isso é que vivemos”. O povo alemão, para Sombart, é o povo “do espirito, da ação, da variedade” (op. cit. p. 176). E no fundo um povo “bárbaro” que aceita alegremente a sua posição, em face do que considera com desdem uma pseudo-civilização.

“Chamam-nos de bárbaros. Pois bem, aceitamos a injuria e dela fazemos um louvor (sic). Somos realmente bárbaros e nos orgulhamos de o ser e queremos continuar a sê-lo. Somos ainda jovens, prontos a todas as novidades. Sabemos que só poderemos cumprir a nossa missão num longínquo futuro” (op. cit. p. 179).

Registremos a confissão… E evoquemos aquelas páginas famosas, já por mim citadas, neste mesmo local, em que Spengler resumiu no seu livro sobre “Os anos decisivos” a essencia do imperialismo da força, de que os alemães querem ter o privilegio no século em que vivemos. Registremos, tambem, nas palavras do vencedor da Europa—o messianismo

Ainda ha pouco, vendo as numerosas versões que do lado alemão ou do lado britânico se faziam em torno da aterrissagem dramática, na Inglaterra, de Rudolph Hess, o III.º Führer do III.º Reich,—só uma explicação plausivel encontrava por esse gesto realmente misterioso. Hess não deve ser, nem um louco nem um homem sadio. É um messiânico, como messiânicos são os dois Führer que o precedem, na escala hierárquica, como messiânico é o III.º Reich, como messiânico é o Nazismo e o como messiânico é todo o pangermanismo. “Eu vim salvar a humanidade”, teria sido, ao saltar do seu paraquedas, o logar-tenente o Führer. Se non é vero… Deveria sê-lo ou poderia sê-lo. A idéia de uma Missão a realizar no mundo é que faz a mística das Panzerdivisionem e o louco heroismo dos paraquedistas de Oslo ou de Candia. Quem lê os “Discursos” de Rudolf Hess, como quem lê toda a literatura nazista, a partir do “Mein Kampf”, o que sente nas linhas, sob as linhas, entre as linhas, por toda parte, é o misticismo da salvação da humanidade pela missão divina do novo povo eleito. O que o povo de Israel foi para a humanidade de outrora, o povo de Hitler será para a humanidade de hoje. É positivamente o que hoje se vive, em pensamentos, palavras e obras, em toda a Alemanha e em cada nazista, considerado pelo messianismo hitleriano. O verdadeiro, o único Messias, é sempre imitado e falsificado pelos pseudo-messias, “simiae Dei”.

Foi Rudolph Hess que, em 1934, levou a multidão alemã ao juramento integral de fidelidade ao Führer, em que o espirito messiânico se manifesta de modo categórico:—“Não jurais sobre um formalismo, não jurais sobre um desconhecido, não jurais sobre uma esperança, jurais sobre uma certeza. O destino vos tornou facil fazer, sem condições e sem restrições, o juramento a um homem. Jamais, por assim dizer na história do mundo, confiou tão cegamente um povo num chefe, como o povo alemão em Adolf Hitler. Tendes a felicidade infinita de dever prestar juramento a um homem que é para vós a incarnação do próprio Chefe em si… Ides jurar a um homem de quem sabeis que, pela vontade de uma lei da providência a que êle obedece, independente de qualquer influência de forças terrenas (sic), ha-de conduzir retamente o povo alemão e ainda dar forma perfeita ao destino do povo alemão… Adolf Hitler é a Alemanha e a Alemanha é Adolf Hitler” (Rudolph Hess—Reden - 2.ª ed. 1938, pg. 14).

Esse messianismo germânico, que o misterioso logar-tenente do Führer foi levar pelos ares aos ouvidos relutantes de Churchill, é o mesmo que, num diapasão diferente sem dúvida, mas num espírito análogo, corre entre as linhas desse “socialismo alemão” com que o velho Sombart procurava por-se em compasso com a vaga do nazismo em ascenção. Sombart lançava, no seu livro, as bases de um novo totalitarismo, bem na linha do seu mestre em filosofia, cuja metafísica terminava, como a de Spengler, pela glorificação do Estado Prussiano—Hegel. 

“Uma ordem assim (visada pelo “socialismo alemão”)—se concebe, já o vimos, como uma organização geral, “total”, da vida, que não se limita a um dominio—o da economia—mas que se estende a todos os aspectos da civilização. Essa ordem deve ser, antes de tudo, unitaria, isto é, saida de um espirito e, partindo de um ponto central, estender-se metodicamente sobre  toda a vida coletiva, social” (op. cit. p. 186).

Antes do Führer tomar conta do poder, o velho sociólogo de Berlim já formulava o principio de Führertum, hoje vitorioso. É certo que não sem restrições. Não fôra à tôa que por tanto tempo Sombart lutara pelos principios do espirito e da liberdade em sua dominação sobre o principio das forças materiais e das leis deterministas. E êle acrescentava - “Não devemos sub-estimar a importância de uma ordem social desse gênero: mas tão pouco devemos super-estimá-las… O socialismo não pode abrir novas fontes: não pode senão dirigir as águas que jorram dessas fontes e que só Deus tem o poder de alimentar”. Mas logo depois, como que arrependido, volta ao hino pan-germanista:—“Só ha uma coisa para nós: a Alemanha. Em bem de grandeza, do poder e do esplendor Alemanha, sacrifiquemos de bôa mente toda “teoria”, todo “principio” (sic), sejam de inspiração liberal ou qualquer outra que seja” (op. cit. p. 188).

A Alemanha é a medida de todas as coisas, acaba afinal por afirmar aquele mesmo homem que tanto combatera o principio renascentista de que êle via derivar todos os males dos tempos “capitalistas”—o homem é a medida de todas as coisas… Não chegou a pronunciar, como Hess, o juramento de que, não mais o homem, não a Alemanha, mas o Chefe, e, no caso, Adolf Hitler é … a medida de todas as coisas! Não chegou, que eu saiba, a dizê-lo. E por isso mesmo, por mais que o velho “professor” coberto de glórias as afobasse em pôr a sua ciência de acordo com os novos Mitos, não conseguiu cair nas graças da nova geração, intolerante e irreverente. Os novos o repudiaram, como a todos os velhos mestres liberais ou socialistas das gerações anteriores. Taboa rasa. 

É num jovem e notavel economista francês, que já ensinou aliás por algum tempo em nosso meio, e conheceu de perto a Alemanha hitlerista logo antes de 1939—que vamos encontrar uma noticia exata do pensamento da nova-Alemanha nazista sobre o velho mestre que trazia o seu “Deutscher Sozialismus” convencido de que iria ser glorificado pela “Hitler-jugend”. Eis como se exprime, a respeito, François Perroux:

—“Nesse vivo e variado conjunto, a obra recente de Werner Sombart (sobre o “Deutscher Sozialismus”) ocupa um lugar à parte. Ele levantou na Alemanha vivas críticas e manifestas reservas. Si o autor do “Capitalismo Moderno” desejava fornecer a seus compatriotas uma “Suma” politico-econômica, que os homens de estado e o publico culto encontrassem o essencial, do nacional-socialismo no tocante ao problema do Estado, da produção e das trocas, não parece que tenha alcançado seu objetivo. A juventude nacional-socialista aponta, na obra de Wernet Sombart, a persistência de uma concepção burguêsa da vida, incompativel com o fim que êle se atribue e os meios que escolhe. Numa noticia publicada pelo “Deutscher Volkertum” (1934) esse gênero de critica exprime-me com grande nitidez… O autor a que nos referimos, censura a Sombart julgar as instituições e os acontecimentos em nome da Cultura e não em nove do Povo. Ora, a jovem Alemanha repudia os valores capitalistas menos por terem adulterado a Cultura que por haverem ferido a unidade e diminuido o poder do Povo Alemão” Aproveitando a deixa para dizer que nós também “repudiamos os valores capitalistas”, mas não por terem adulterado a Cultura ou o Povo, e sim a Ética, a , a Revelação Divina, a subordinação dos valores naturais aos valores sobrenaturais, o Cristinianismo, enfim. Mas, voltando a Perroux:—“Os jovens nacionais-socialistas, que não concordaram com Sombart quanto ao fim, menos ainda concordam com os meios que êle propõe. Censuram-lhe amargamente dar mais importância à nação do que ao povo (Volk), mais ao partido do que ao movimento (Bewegung). mais à economia planificada do que a orientação politica da economia (Fürung)”. (François Perroux—os mitos hitlerianos. Problemas da Alemanha contemporanea. Trad. bras. 1937, pgs. 133/135).

Em suma, o grande Sombart… perdeu o seu latim. Como sempre sucede aos que pretendem aos novos deuses em moda, sobretudo quando sua obra é precursora daquilo que os novos pretendem sempre ter descoberto sozinhos, não teve ninguem por si. E morreu como Spengler, e como morreu quasi todos os que se antecipam ao seu tempo, repudiado por aquele mesmo que tinha ajudado a nascer e a subir. 

Fora da Alemanha, só nos Estados Unidos, creio eu, tem encontrado a obra de Sombart, no que tem de forte e verdadeiro, uma repercussão autêntica. Ele mesmo indicou alguns dos que ali seguiam as suas pegadas:—“Nos Estados Unidos destacou-se uma turma de sociólogos que se aplicaram ao desenvolvimento de uma teoria compreensiva (Vestehende Theorie) da Economia. Lembro os nomes de Cooley, Faris, Ellwood, Baldwin, etc. Outros povos, tanto quanto sei, não se ocupam ainda com o cerne do nosso problema” (Die Drei Nationalökonomien. p. 161).

Num balanço que, em 1925, empreenderam varios sociólogos norte-americanos sobre o estado atual das ciências sociais, assim se exprimiram em relação à Economia: - “Devemos ver, sem alarme, o crescimento nos Estados Unidos de uma escola institucional ou genética, universitaria, dirigida por T. B. Veblen e por W. C. Mitchell. Essa escola, que se apoia nas obras academicas (scholarly) e volumosas de Webbs, Hammonds e Werner Sombart, parece exercer grande fascinação sobre os jovens economistas americanos… O Institucionalismo ou Economia Institucional merece atenção especial, pois é o maior esforço recentemente empreendido para pôr a Economia em relação com as disciplinas que lhe são conexas” (“The History and Prospects of the Social Sciences”, edited by H. E. Barnes, 1925, pg. 392).

Contra o “homo oeconomicus” abstrato, sem alma, sem vida, é que reagiu Sombart, como reagem os institucionalistas, segundo a sentença de Othmar Spann:—“A economia politica não é uma ciência de negócios, mas uma ciência da vida…” “Os institucionalistas norte-americanos seguiram por essa linha. Não apenas a riqueza material, mas a vida como um todo - embora com vistas particularmente voltadas para o aspecto econômico - tem sido o objeto de seu estudo” (E. Wittaker—op. cit. p. 737). Foi exatamente esse o grande mérito de Werner Sombart a quem podemos, com razão, chamar o Bergson da moderna economia politica.

Com o grande filósofo francês, deslocou Sombart o centro dos valores econômicos da natureza exterior para o espirito. Como êle, reagiu contra o conceito meramente quantitativo desses valores, mostrando a importância da qualidade, mesmo nos valores utilitarios. Como o filósofo da “duração”, mostrou Sombart a importância do tempo na transformação dos valores de satisfação das necessidades materiais do homem e ainda como a metafísica da “intuição” reagiu o autor do “Capitalismo Moderno” contra o racionalismo que invadira e deturpara o sentido profundo da Ciência Econômica.

Assim como Bergson humanizou a filosofia dos tempos modernos, também Sombart, operou, no terreno econômico social, a mesma evolução no sentido da primazia dos valores humanos. E o sentido compreensivo da filosofia econômica de Sombart, tem o mesmo calor integrante da metafísica compreensiva do filósofo das “Deux Sources”.

Será que Sombart já pertence a um estagio ultrapassado de valores mentais, como melancolicamente lembrava ha tempos Euryalo Canabrava, nos seus magistrais estudos sobre Bergon?

O culturalismo econômico de Sombart é confessadamente relativista. Vive, como todo panteismo, o que vive o espirito do seu tempo. Ha, porém, uma janela aberta no sentido dos valores eternos, que se desprende de sua grande obra e que ultrapassa de muito o que ha de efêmero em que seu hegelianismo inconsistente ou em seu nacional-socialismo oportunista…

Seu mérito indelével ha-de ser o de ter reconciliado a Economia com a Vida. Seu humanismo econômico tem um posto insubstituível na reação continua que temos de empreender contra a deshumanização dos valores que é o grande veneno que corróe as fibras mais intimas do nosso tempo. 

Basta isso para que o consideremos, sem o acompanhar em seus erros, como um dos mestres da nossa geração.

Voltar para o blog

Deixe um comentário