"Spengler nos dias de Hoje", por Theodor W. Adorno

"Spengler nos dias de Hoje", por Theodor W. Adorno

Traduzido por Gabriel Marculino

 

[Originário de Zeitschrift für Sozialforschung 9 (2):305-325 (1941)]

 

Sugeriu-se que a história da filosofia não consiste tanto em ter os seus problemas resolvidos quanto em vê-los esquecidos pelos movimentos intelectuais que eles próprios puseram em movimento.

A doutrina de Oswald Spengler foi esquecida, e com a velocidade que ele mesmo atribuiu à história universal ao dizer que estava se desenvolvendo rapidamente o momento de uma catástrofe.

Após um primeiro sucesso popular, a opinião pública alemã rapidamente se voltou contra o livro. Os filósofos oficiais censuraram-na pela sua superficialidade, as ciências oficiais específicas classificaram-na de incompetente e charlatã e, durante a azáfama do período de inflação e estabilização alemã, a tese de Decline of the West[1] não foi muito popular.

Enquanto isso, Spengler tinha-se exposto de tal forma numa série de estudos mais pequenos, de tom arrogante e cheios de antíteses baratas, que uma atitude negativa em relação a ele se tornou fácil para aqueles que queriam continuar como estavam. Quando, em 1922, apareceu o segundo volume da obra principal, ficou muito aquém da atenção que tinha sido dada ao primeiro, embora o segundo tenha sido, de fato, o volume que se desenvolveu concretamente a tese do declínio.

Os leigos que liam Spengler como antes liam Nietzsche e Schopenhauer tinham-se afastado da filosofia. Os filósofos profissionais logo abraçaram Heidegger, que deu sua apatia uma expressão mais elevada e mais excelente, enobrecendo a morte (que Spengler decretou, de certa forma, naturalisticamente) e prometendo mudar o pensamento dele em uma panaceia acadêmica.

Spengler tinha tido os seus problemas em vão. Não era permitido seu pequeno livro a respeito do homem e a técnica estar na mesma classe com as inteligentes antropologias filosóficas do mesmo tempo. Dificilmente qualquer nota era tomada de suas relações com o Nacional Socialismo, sua controvérsia com Hitler, ou sua morte.

Hoje, na Alemanha, ele é proclamado como um resmungão e reacionário, no sentido Nacional Socialista da palavra. No exterior, ele é considerado um dos cúmplices ideológicos do novo barbarismo, um representante do tipo mais brutal do imperialismo Prussiano.

Mas, a despeito de tudo isso, há boas razões, mais uma vez, para perguntar se os ensinamentos de Spengler são verdadeiros ou falsos. Seria conceder-lhe demasiado para olhar para a história universal, que o ultrapassou no seu caminho para a Nova Ordem do tempo, para o julgamento final sobre o valor das suas ideias.

Há, no entanto, até menos ocasiões para fazer isso, pois o curso da história do mundo tem em si vindicado sua prognose imediata a uma extensão que seria assombroso caso esses prognósticos sejam relembrados.

O esquecido Spengler toma sua vingança ameaçando estar certo. Seu esquecimento testemunha uma impotência intelectual comparável à da impotência política da República de Weimar face a Hitler.

Spengler mal encontrou um adversário que era seu igual, e o esquecimento funcionou como uma evasão. Aquele que só leu o livro de Manfred Schroeter, Der Streit um Spengler, com o seu levantamento completo da literatura até 1922, tornou-se consciente de quão grotescamente o Espírito Alemão fracassou contra um oponente para o qual o poder substancial da filosofia alemã da história parecia ter passado.

A pedantia cuidadosa no concreto, no otimismo conformista e palavroso na ideia e, constantemente, em uma concessão involuntária de fraqueza na garantia de que, afinal, as coisas ainda não estão tão ruins a respeito da nossa cultura, ou no sofisma de abalar a posição relativística de Spengler exagerando seu próprio relativismo—isso é tudo que a filosofia Alemã e a ciência poderia usar contra um homem que os repreendia como um sargento-mor repreenderia um novato.

Por detrás de seu abandono, poderia-se suspeitar da presença de um impulso secreto para obedecer o sargento-mor no fim.

Torna-se mais urgente tomar uma posição contra essa filosofia. Tentemos, portanto, primeiro ver a força de Spengler comparando algumas de suas teses com nossa própria situação; a partir disso, buscar as fontes do poder que deu tal força a sua filosofia, os defeitos teóricos e empíricos do qual são tão simplesmente evidentes; e deixe-nos finalmente perguntar, sem estar antecipadamente seguro de uma resposta positiva, que considerações poderiam possivelmente ser capazes de sustentar seu chão contra Spengler sem uma falsa postura de força e sem a má consciência de otimismo oficial.

A fim de demonstrar a força de Spengler, primeiro de tudo, não discutiremos seu conceito geral histórico-filosófico de crescimento a deterioração da cultura análogo ao de uma planta, mas a maneira que ele dirigiu essa filosofia da história à fase iminente da história antes de nós, que ele chamou Cesarismo, em analogia com o período do Império Romano.

Suas predições mais características pertencem a questões de dominação de massa, tais como propaganda, cultura de massa, formas de manipulação política, particularidade a certas tendência inerentes na democracia que ameaçam torná-la uma ditadura.

Em comparação com esses elementos, especificamente as predições econômicas não desempenham senão um papel menor, de acordo com a visão geral de Spengler que a economia não é uma realidade social básica, mas ao invés disso, uma “expressão” de “almanidades[2]” particulares. A questão do monopólio não é levantada, embora Spengler agudamente esteja consciente das consequências culturais da centralização do poder. Ainda sim, seu insight vai longe o bastante para revelar certos fenômenos econômicos notáveis, tais como o declínio da economia monetária.

Do seu segundo volume foram selecionadas algumas reflexões sobre a civilização na era do Cesarismo. Começamos com algumas citações a respeito da “fisionomia” da metrópole moderna. Spengler diz das casas da grande cidade: “Elas são, geralmente falando, não mais casas na qual Vesta e Janus, Lares e Panates, tem qualquer tipo de piso, mas meras premissas no qual eram moda, não por sangue mas por requerimentos, não por sentimento mas pelo espírito do empreendimento comercial. Tão logo a lareira tenha um significado piedoso como o centro real e genuíno de uma família, a antiga relação com a terra não está totalmente extinta. Mas quando isso, também, seguir o resto em esquecimento, e a massa de inquilinos e ocupantes de camas [bed-occupiers] no mar de casas levam uma existência vagabunda, de abrigo em abrigo, como os caçadores e pastores do tempo “pré”, assim o nômade intelectual está completamente desenvolvido. Essa cidade é um mundo, ela é o mundo. Somente como um todo, como um local de habitação humana [dwelling-place], tem-se significado, as casas sendo meramente as pedras no qual se está instalado[3]”.

A imagem do habitante da cidade dos últimos tempos como um segundo nômade merece ênfase especial. Ela expressa não apenas medo e distanciação, mas o caráter “menos-histórico” do amanhecer, de uma situação na qual os homens se experimentam apenas como objetos de processos opacos e em que, entre o choque súbito e o esquecimento súbito, eles não são mais capazes de qualquer sentido contínuo de tempo.

Spengler claramente vê a interconexão entre pauperização e o novo tipo de homem que foi-se completamente revelado a si mesmo no surto totalitário: “Mas sempre as esplêndidas cidades de massa nutrem uma pobreza lamentável e hábitos degradados, e os sótãos e mansardas, os porões e os pátios das casas estão criando um novo tipo de homem bruto[4]”. Ele sabe pouco sobre as condições responsáveis básicas para sua pobreza. Mas vê com mais clareza o quadro de Espírito que domina as massas fora do processo de produção efetivo, questões geralmente referidas como “tempo livre”. “A tensão, ao tornar-se intelectual, não sabe forma de recreação senão aquela que é específica da cidade mundial—a saber, détente, relaxamento, distração. Jogo genuíno, alegria de viver [joie de vivre], prazer, embriaguez, são produtos da batida cósmica e como tal não mais compreensíveis em sua essência. Mas o alívio do árduo trabalho cerebral intensivo a partir de seu oposto—tolice consciente e praticada—, alívio da tensão intelectual pela tensão corporal do esporte, da tensão corporal pelo esforço sexual após o “prazer” e o esforço espiritual depois das “excitações” de apostas e competições, da lógica pura do trabalho do dia por um misticismo conscientemente desfrutado—tudo isso é comum às cidades-mundo de todas as Civilizações”[5].

Spengler construiu essa ideia na tese de que “a arte em si mesma se torna um esporte”. Ele não conhecia nem Jazz nem Quiz, mas se fosse resumir as tendências mais visíveis de nossa cultura de massa presente, não se poderia encontrar uma categoria mais cheia do que essa do esporte, a transposição de obstáculos rítmicos e o concurso ou competição entre os artistas ou entre a produção e o público. A força total do desdém de Spengler é lançado nas vítimas da cultura da propaganda de nossa época. O “que resta é o tipo Felá[6][7].

Spengler descreve esse tipo Felá mais concretamente como resultando de uma expropriação da consciência humana através de meios centralizados de comunicação pública. Continua a concebê-lo em termos de poder monetário, embora preveja o fim da economia monetária. De acordo com ele, o Espírito, no sentido de autonomia ilimitada, pode existir apenas em relação ao medium abstrato do dinheiro. No entanto, a sua descrição é totalmente correta no que diz respeito às condições do regime totalitário, que declarou uma guerra ideológica contra o dinheiro e o Espírito.

Pode-se dizer que Spengler se tornou consciente dos traços na imprensa que foi completamente desenvolvida só depois, quando o rádio entrou em cena, de como levantou objeções contra a democracia que alcançava seu peso total apenas quando a própria ditadura se estabeleceu. “A democracia, através do seu jornal, expulsou completamente o livro da vida mental do povo. O livro do mundo, com sua profusão de opinião, que compelia o pensamento a selecionar e criticar, é agora uma posse real apenas para alguns. As pessoas lêem o único jornal, o “seu” jornal, que entra pela porta da frente aos milhões todos os dias, que prende o intelecto da manhã à noite, que empurra o livro para o esquecimento através da sua apresentação mais cativante e que, se um ou outro exemplar de um livro surge na visibilidade, previne e elimina os seus possíveis efeitos através da sua “revisão”[8].

Spengler tem uma noção do caráter dual do esclarecimento [enlightenment] na era da dominação universal. “Com a imprensa política, é atada a necessidade da educação escolar universal, que no mundo clássico foi completamente ausente. Nessa demanda há um elemento—bastante inconsciente—de desejar pastorear as massas, como o objeto de partidos políticos, na área poderosa do jornal. O idealista da educação antiga considerou a educação popular, sem arrière pensée, enquanto puro e simples esclarecimento, e mesmo hoje se encontra aqui e lá cabeças fracas que se tornaram entusiastas a respeito da Liberdade da Imprensa—mas é precisamente isso que tranquiliza o caminho para o vindouro césares da imprensa do mundo. Aqueles que aprenderam a ler sucumbiram a seu poder, e a visionária auto-determinação dos povos pelos poderes cuja palavra impressa obedece”[9].

As coisas que Spengler atribui aos magnatas da imprensa modesta da primeira guerra mundial desabrocharam na técnica de pogroms manipulados e demonstrações populares espontâneas. “Sem que o leitor a observe, o jornal, e a si mesmo com ele, o mestre muda”[10]—isso literalmente se tornou verdade sob o Terceiro Reich. Spengler chamou isso de “o estilo do século XX. Hoje, um democrata da antiga escola não demandaria liberdade para a imprensa; entretanto os líderes se transformaram em parvenus que garantem sua posição vis-à-vis as massas”[11].

Ele profecia Goebbels: “Nenhum domador tem mais seus animais sob o seu poder. Solte o povo enquanto massa de leitores e irá explodi-lo através das ruas e arremessá-los sob o alvo indicado, aterrorizando e quebrando janelas; uma dica para a staff de imprensa e tornar-se-á quieto e há de ir a casa. A imprensa hoje é um exército com armas e setores cuidadosamente organizados, com jornalistas como oficiais, e leitores como soldados. Mas aqui, como em todo exército, o soldado obedece cegamente, ao passo que objetivos de guerra e planos de operação mudam sem seu conhecimento.

O leitor não sabe, nem lhe é permitido saber, os propósitos pelo qual ele é usado, nem mesmo o papel que ele desempenha. Uma caricatura mais chocante da liberdade de pensamento não pode ser imaginada. Antigamente um homem não ousava pensar livremente. Agora ele se atreve, mas não pode; sua vontade de pensar é apenas uma boa vontade de pensar em ordenar, e isso é o que ele sente como sua liberdade”[12].

O prognóstico especificamente político não é menos assombroso. Primeira de todas as predições militares, que, incidentalmente, possa ter sido influenciado por certas experiências do exército Alemão comandado durante a primeira guerra mundial, experiências que foram colocadas em prática enquanto isso. Spengler considera o princípio “democrático” do serviço militar universal obsoleto, junto com os meios táticos derivados dele. “O lugar de exércitos permanentes como o conhecemos gradualmente será tomado pelas forças profissionais de soldados ávidos de guerra, voluntários; e milhões se revertem para cem ou duzentos. Mas ipso facto esse segundo século será aquele dos Estados realmente rivais. Esses exércitos não são substitutos para guerra”—como foi o caso, de acordo com Spengler, durante o século XIX—“eles foram para a guerra e queriam guerra. Dentro de duas gerações serão eles cuja vontade prevalecerá sobre a de todos os acomodados juntos. Nessas guerras dos seus para a herança do mundo inteiro, continentes estarão em jogo, Índia, China, África do Sul, Rússia e Islã desafiados, novas técnicas e táticas desempenhadas e contra-desempenhadas. O grande foco cosmopolita do poder irá dispor a seu prazer de pequenos estados—seu território, sua economia e seus homens de forma igual—tudo isso é agora meramente província, objeto passivo, meios para um fim, e seus destinos são sem importância à grande marcha das coisas. Nós mesmos, em alguns anos, aprendemos a tomar pouca ou nenhuma notícia de eventos que antes da Guerra teriam horrorizado o mundo”[13].

Mas a era a que Spengler se refere como aquela de estados rivais é seguida, de acordo com ele, por um período que é “sem história” em um sentido mais medonho. Esse prognóstico paradoxal é claramente paralelo pela tendência da economia presente de eliminar o mercado e as dinâmicas de competição. Essa tendência é dirigida para condições estáticas que já não sabem mais de crises no sentido estritamente econômico do termo.

O trabalho de outros é apropriado, sem qualquer processo intermediário, por aqueles no comando dos meios de produção, e a vida daqueles que fazem o trabalho é sustentada planejadamente de cima[14]. O que Spengler corretamente profetiza para os estados pequenos enquanto unidades políticas também começa a materializar-se entre os próprios homens nos amplos estados e particularmente entre os habitantes de poderosos totalitários.

Aqui o homem se tornou mero objeto. É por isso que a história parece extinguir-se. O que quer que aconteça, estritamente falando, acontece a eles mas não através deles. Mesmo os maiores golpes de estratégia e as marchas triunfais conservam um toque de ilusão e não são verdadeiramente reais. Os acontecimentos desenrolam-se entre os oligarcas e os seus especialistas em assassinatos. Eles não são engendrados pela dinâmica inerente da sociedade, mas sim submetê-las a uma administração que, por vezes, chega ao ponto de provocar aniquilação. Ataques noturnos de bombardeiros a cidades que ficam praticamente indefesas, mesmo que se defendam, é este o tipo de história que hoje se estabelece. Os edifícios de Hitler em Nürnberg, esquecidos como são nos dias que não são de congressos partidários, têm algo de egípcio que deveria ter encantado Spengler. Eles são como os monumentos de um conquistador estrangeiro, estranhamente isolado no país subjugado. Até mesmo a voz de Hitler, soando como se viesse de uma torre de marfim, tem o anel dessa isolação.

Como objetos de forças políticas, o homem perderá sua vontade e espontaneidade política. “Antigamente a Idade Imperial havia chegado, não existiam mais problemas políticos. As pessoas lidam com a situação tal como ela é e com os poderes instituídos. No Período dos Estados Rivais, correntes de sangue avermelharam os pavimentos de todas as cidades do mundo, de modo que as grandes verdades da Democracia podem ser transformadas em realidades, e para a conquista de direitos sem os quais a vida parece não valer a pena ser vivida. Agora estes direitos são conquistados, mas o herdeiro não pode ser movido, nem por castigo, a fazer uso deles”[15].

A predição de Spengler de uma mudança essencial dentro da estrutura dos partidos políticos corroborou ao pé da letra pelo Nacional Socialismo: o partido tem se tornado um mero “seguidor”. Sua “fisionomia” do partido é extraordinariamente impressionante, visualizando o parentesco entre o sistema de partido e o liberalismo de classe média. “Um partido nobre num parlamento é tão espúrio quanto um proletário. Apenas o burguês está em seu lugar natural ali”[16].

Ele enfatiza os mecanismos inerentes que tendem a fazer o sistema de partido se transformar em ditadura. Tais considerações tem, de começo, sido familiares as filosofias “cíclicas” da história. Maquiavel em particular desenvolve a ideia de que a corrupção de instituições democráticas, a longo prazo, engrendaria a ditadura de novo e de novo. Mas Spengler, que em certo sentido revive, no fim de uma época, a posição que Maquiavel ocupava no começo dessa época, mostra-se superior a esse antigo filósofo político na medida em que ele teve a experiência da dialética da história, embora ele nunca a chame pelo nome.

Para ele, o princípio da democracia desenvolve a si em seu oposto pela força de suas próprias implicações. “O período de governo do partido real cobre apenas dois séculos, e em nosso caso é desde a Guerra Mundial, estamos em declínio. Que a massa inteira do eleitorado, atuada por um impulso comum, deve mandar homens que são capazes de gerenciar seus casos—que é a ingênua suposição em todas as constituições—é uma possibilidade apenas no primeiro investimento, e pressupõe que não existam sequer os rudimentos de organização por grupos definidos. Foi o que aconteceu em França em 1789 e (na Alemanha TWA) em 1848.

Basta haver uma assembleia para que se formem imediatamente unidades tácticas no seu seio, cuja coesão depende da vontade de manter a posição dominante uma vez conquistada, e que, longe de se considerarem porta-vozes dos seus eleitores, se empenham em tornar todos os meios de agitação passíveis da sua influência e utilizáveis para os seus objetivos. Uma tendência que se organizou no povo já tem, ipso facto, se tornado o instrumento da organização e continua firmemente em diante com o mesmo caminho até que a organização também se torne, por sua vez, o instrumento do líder. A vontade de poder é mais forte do que qualquer teoria. No começo o líder e o aparato vem à existência pelo bem do programa. Depois, são agarrados defensivamente pelos seus detentores por causa do poder e do saque—como já acontece universalmente hoje em dia, pois milhares de pessoas em todos os países vivem do partido e dos cargos e funções que ele distribui. Por fim, o programa desaparece da memória e a organização funciona apenas para si própria.

Apontando para a Alemanha, ele prevê os anos de governos milagrosos que ajudaram Hitler a chegar ao poder: “A Constituição alemã de 1919 - que, em virtude da sua data, se encontra à beira do declínio da democracia—admite muito ingenuamente uma ditadura das máquinas partidárias, que atraíram todos os direitos para si próprias e não são seriamente responsáveis perante ninguém. O notório sistema de eleição proporcional e o Reichsliste asseguram o seu auto-recrutamento.

No lugar do direito dos povos, que foram axiomatizados na constituição de Frankfurt de 1848, existe agora apenas o direito dos partidos, que, soando inofensivo, realmente enferma dentro de si um cesarismo das organizações, No entanto, há de se admitir que a esse respeito é a mais avançada de todas as constituições. Seu problema já é visível. Algumas pequenas alterações consideráveis e confere-se poder irrestrito aos indivíduos”[17].

Spengler fala da maneira na qual o curso da história faz o homem esquecer a ideia e realidade de sua própria liberdade. “O poder que essas ideias abstratas”—incorporadas, de acordo com Spengler, no Contrato social e no Manifesto Comunista—“na qual, no entanto, sua posse não se estende no tempo para além de dois séculos que pertencem a política partidária, e seu fim chega não da refutação, mas do tédio—que já matou Rousseau há muito tempo e que matará Marx em breve. O homem desistiu, não dessa ou daquela teoria, mas da crença na teoria de qualquer tipo, e com ela o otimismo sentimental de um século XVIII que imaginava que as realidades insatisfatórias podiam ser melhoradas pela aplicação de conceitos”[18].

“Para nós, também—não nos enganemos—a era da teoria está chegando ao fim”[19]. Sua predição de que o poder de pensar irá morrer termina em um tabu a respeito do pensamento que ele tenta justificar sob as bases do curso inexorável da história.

Isto toca no ponto Arquimédico do esquema de Spengler. Sua asserção histórico-filosófica de que o espírito (Geist) está morrendo, e as consequências anti-intelectuais derivadas dessa asserção, não relatam meramente a fase “civilização” da história, mas são elementos básicos da estimativa do Homem de Spengler. “A verdade existe para o espírito, fatos somente em relação a vida. A abordagem histórica—na minha terminologia de tato fisionômica—é decidida pelo sangue, o dom de julgar os homens, alargado ao passado e ao futuro, o talento inato para as pessoas e as situações, para os eventos, para o que tinha de ser, precisa ter sido. Não consiste em crítica científica nua e crua e conhecimento de dados”[20]. O fator decisivo aqui é o dom de julgar os homens, pelo qual tem-se no texto Alemão o termo preciso: Menschenkenntnis.

Encontramos implícito a suposição Maquiavélica de uma natureza humana imutável. Apenas se reconhece a natureza humana como base de uma vez e por uma vez a fim de ser capaz de dispor dela de uma vez por todas na expectativa de que ela volte a ser a mesma. O dom de julgar os homens neste sentido equivale ao desprezo pelos homens: eles são como são.

O interesse orientador dessa visão é a dominação, e todas as categorias de Spengler são modeladas para agarrar esse conceito. Seja qual for o período que aborda, toda a sua simpatia recai sobre aqueles que governam.

O filósofo da história desiludido, quando discute a inteligência e a vontade de ferro dos líderes industriais modernos, está suscetível de se afundar como um dos pacifistas por quem professa um desprezo tão obstinado. O parentesco com o ideal de dominação permite a Spengler o profundo insight de que a qualquer hora as potencialidades desse ideal estarão em questão e cega-o com ódio assim que encontra impulsos que vão para além das relações de dominação que prevaleceram na história até agora.

Os sistemas Alemães do idealismo tendiam a fazer fetiches de conceitos universais prodígios e, indiferentemente, sacrificar-lhes a existência humana nas suas teorias. Essa tendência—que Schopenhauer, Kierkegaard e Marx atacaram em Hegel—Spengler acentua ao ponto de desfrutar-se indisfarçadamente com o sacrifício humano.

Onde a filosofia da história de Hegel fala de profundo sofrimento do “banco dos réus [slaughter-bench] da história”, Spengler não vê nada senão fatos; fatos, em verdade, que de acordo com nosso temperamento e humor, podemos deplorar, mas que é melhor não nos preocuparmos se estivermos de acordo com a necessidade histórica e se a nossa fisionomia estiver do lado dos batalhões mais fortes. “Spengler” —diz James Shotwell em sua notável resenha— “está interessado no grande e trágico drama que representa e desperdiça pouca simpatia ociosa com as vítimas da noite recorrente”[21].

Saltar entre culturas como se fossem pedras multicoloridas e operantes, de forma bastante desinteressada, com o Destino, o Cosmos, o sangue e a mente, a vastidão da própria concepção de Spengler expressa o intuito da dominação. Ele que, sem hesitar, reduz os fenômenos à fórmula de que “tudo isso já aconteceu antes”, pratica uma tirania de categorias muito parecida com a tirania política que tanto entusiasma Spengler. Ele faz malabarismos com a história nas colunas de seu plano de cinco mil anos, da mesma forma que Hitler desvia minorias de um país para outro.

No final, não há mais nada. Tudo se encaixa, e toda resistência oferecida pelo concreto é eliminada. Por mais inadequadas que tenham sido as críticas levantadas contra Spengler pelas ciências culturais individuais, demonstraram um bom instinto em um ponto. Escapa-se a miragem da Grossraumwirtschaft histórica de Spengler apenas pelos únicos elementos cuja teimosia desafia a classificação ditatorial.

Spengler, em virtude de sua perspectiva e da vastidão de suas categorias, pode ser superior àquelas ciências individuais restritas. Mas ele é, também, inferior a elas por virtude dessa própria vastidão que ele alcançou por nunca realizar honestamente a análise da inter-relação entre conceito e detalhe, preferindo evitá-la por meio de uma estrutura conceitual que utiliza o “fato” ideologicamente para apressar o pensamento, sem nunca lançar mais do que um primeiro olhar de coordenação sobre o fato real.

Há um elemento aqui de espúrio e pomposo, que não é diferente da Siegesallee Wilhelmiana. Só quando a própria realidade se transforma em uma Siegesallee, ela assume a forma que Spengler deseja atribuir a ela. A superstição que a grandeza de uma filosofia é uma função de seu aspecto grandioso, é uma má herança idealista, equivalente a crença de que a qualidade de uma pintura depende da sublimidade de seu tema em questão.

Grandes temas não garantem grandeza de insight. Se, como insiste Hegel, o todo é a verdade, ele é a verdade somente se o poder do todo entra completamente na cognição do particular. Nada disso pode ser encontrado em Spengler. O particular nunca revela algo que ele não estava consciente antes, por meio das tabelas de sua análise comparativa da morfologia cultural. Ele se vangloria do caráter fisionômico de seu método. Na verdade, suas “fisionomias” estão ligadas à pretensão de totalidade inerente às suas categorias.

Tudo o que é individual, por mais remoto que seja, torna-se para ele uma cifra do grande, da cultura. O mundo é concebido como sendo tão completamente governado pela classificação em culturas que não resta nada que não ceda facilmente à grandeza das categorias e até mesmo coincida essencialmente com elas[22]. Isso contém um elemento de verdade na medida em que cada sociedade histórica até agora tende a cristalizar a “totalidade” que não permite qualquer liberdade do item individual.

Totalidade pode ser caracterizada como a forma lógica da sociedade opressiva. A fisionomia de Spengler tem o mérito de direcionar a atenção para a cultura expressada pelo individual, mesmo quando este assume um ar de liberdade por trás do qual a dependência universal está oculta. Mas esse mérito é mais do que compensado. Sua insistência na dependência universal de itens individuais sob o todo, sob a totalidade da cultura que eles deveriam expressar, faz com que as dependências concretas que determinam a vida do homem desapareçam na larga generalização dele. Assim Spengler joga a fisionomia contra a causalidade.

Sua fisionomia também se baseia nas reações passivas de massa e na concentração de energia que as produz, sem enfatizar sua interconexão causal e, talvez, sua interação. Se essa interconexão causal é derrubada, torna-se possível para Spengler nivelar relações de poder social e a dependência até o Destino e a hora quase biológica da alma cultural. Ele consegue sobrecarregar metafisicamente o impotente homem-massa com a ignomínia que lhe foi historicamente imposta pelos césares.

O olhar da fisionomia se perde ao coordenar os fenômenos com alguns títulos que funcionam como invariantes de seu “sistema”. Em vez de se aprofundar no caráter expressivo dos fenômenos, ele rapidamente enclausura sob slogans publicitários estridentes os fenômenos que ele juntou de forma ingrata.

Para fins de venda, ele vasculha as ciências individuais em grande escala. Se fosse caracterizar o próprio Spengler em uma linguagem da forma da civilização que ele denuncia, teria de se comparar a Decadência do Ocidente com a loja de departamentos no qual o agente intelectual oferece à venda, as secas séries literárias que ele comprou a baixo custo do patrimônio falido da cultura. Spengler revela o ressentimento amargurado de um erudito de classe média Alemão, que quer, finalmente, capitalizar o tesouro de seu aprendizado e investi-lo no ramo de negócios mais promissor, ou seja, na indústria pesada.

Sua proclamação do colapso da cultura é um pensamento ansioso. O espírito espera ser perdoado ao tomar o partido de seu maior inimigo, o poder, e, por meio da autodenúncia, treina-se para fornecer ideologias anti ideológicas. Spengler executa o aforismo de Lessing sobre o homem que era prudente o bastante para não ser prudente. Sua percepção da impotência dos intelectuais liberais sob a sombra do poder totalitário em ascensão faz com que ele os abandone. A introdução à Decadência do Ocidente contém uma passagem que se tornou famosa: “E só posso esperar que os homens da nova geração possam ser movidos por este livro a se dedicar à técnica em vez da letra, ao mar em vez do pincel e à política em vez da epistemologia. Não se poderia fazer melhor.[23]

Pode-se facilmente imaginar os personagens para quem isso foi dito—com uma respeitosa olhada de relance para o lado. Spengler coincide com a opinião de que já é hora de chamar a população jovem à razão de uma vez por todas. Pede-se pelo auxílio de alguns líderes que se tornaram posteriormente os proponentes da Realpolitik. No entanto, a Realpolitik ainda não explica sua ira contra pinturas, poemas e filosofia.

Essa ira revela um profundo sentido do estágio “sem-história” que Spengler descreve com aterrorizante gratificação. Onde não existem mais “problemas políticos” no sentido tradicional, e talvez nem mesmo “economia” irracional, a cultura pode cessar de ser a fachada inofensiva que Spengler pretende demolir, a menos que seu declínio possa ser resguardado a tempo. A cultura pode então explodir as contradições que aparentemente haviam sido superadas pela arregimentação da vida econômica.

Mesmo agora as culturas oficialmente promovidas dos países Fascistas provocam a risada e o ceticismo daqueles que são forçados a engoli-la. Toda a oposição contra o totalitarismo encontra seu refúgio em livros, em igrejas, e nas peças de teatro dos clássicos que são tolerados porque são clássicas e deixam de ser clássicos quando são tolerados.

O veredito de Spengler atinge indiscriminadamente a cultura oficial e seu oposto não-conformista. Os retratos em movimento e o expressionismo são unidos pela mesma sentença de morte. O veredito indiferenciado serve perfeitamente para a moldura da mente dos diretores da cultura Nacional-Socialista. Eles desprezam suas próprias ideologias como mentiras, odeiam a verdade e só conseguem dormir tranquilos quando ninguém mais se atreve a sonhar.

As ciências culturais especiais, particularmente nos países Anglo-saxônicos, normalmente visualizam Spengler como um metafísico que está pronto para atacar a realidade com a arbitrariedade de suas construções conceituais. Próximo aos idealistas, que sentem que Spengler rejeitou o progresso na consciência da liberdade, os positivistas são os oponentes mais irritados de Spengler.

Não há dúvida que sua filosofia faz violência ao mundo, mas essa é a mesma violência que o mundo deve sofrer diariamente na realidade. A história, primeiramente, se recusou a desdobrar-se a si mesma de acordo com o esquema hegeliano. Aparece agora como sendo mais disposta a congelar de acordo com o esquema de Spengler.

Se uma filosofia é metafísica ou positivista, não pode ser decidido imediatamente. Na maioria das vezes, os metafísicos são apenas positivistas mais perspicazes ou menos intimidados. No final das contas, Spengler é o metafísico que ele e seus inimigos gostam de considerá-lo? Certamente é, tão logo se permanece em um nível formalístico. Seus conceitos superam a exatidão empírica de seu dado, sua “verificação” é difícil ou impossível, e os instrumentos epistemológicos de seu método surgem a partir de um irracionalismo de certa forma áspero e primitivo.

Se, entretanto, basearmos-nos na substância desses conceitos, sempre nos deparamos com os desideratos positivistas, sobretudo o culto ao “fato”. Spengler não permite qualquer ocasião que passe sem caluniar o caráter transcendente da verdade e sem glorificar aquilo que é assim e assim e de nenhuma outra forma, aquilo que só precisa ser registrado e aceito. “Mas no mundo histórico não há ideias, mas somente fatos—não há verdade, mas apenas fatos. Não há razão, nem honestidade, nem equidade, nem objetivo final, mas somente fatos, e qualquer um que não perceber isso deveria escrever livros sobre política—que não tente fazer política.”[24]

O insight essencialmente crítico sobre a impotência da verdade na história prévia, o insight sobre o poder predominante que o mero existente tem sobre todas as tentativas da consciência de romper o círculo da mera existência—isso degenera em Spengler em uma justificativa do mero existente em si. O fato de que algo que tem poder e é bem-sucedido pode estar errado—essa é uma ideia totalmente inconcebível para Spengler. Ou ao invés disso, é uma ideia que ele proíbe espasmódicamente a si mesmo e aos outros. Ele é tomado pela raiva sempre que se depara com a voz dos impotentes e, ainda assim, não tem nada a oferecer contra essa voz, exceto a afirmação de que ela é impotente de uma vez por todas.

A doutrina de Hegel que o real é racional se torna uma mera caricatura. Spengler sustenta que o modo hegeliano de que o real é repleto de significado e rigor e sustenta a ironia de Hegel contra o reformador do mundo (Weltverbesserer), mas, ao mesmo tempo, seu pensamento em categorias nuas de dominação rouba da realidade a pretensão de sentido e razoabilidade em que se baseia o humor hegeliano.

A razoabilidade e a irrazoabilidade da história são o mesmo para Spengler, pura dominação, e o fato está onde quer que o princípio da dominação se manifeste. Ele incessantemente imita o tom dominante de Nietzsche, embora nunca absolva a si, como Nietzsche fez, da conformidade com o mundo como ele é. Nietzsche diz em um ponto que Kant usou os meios da ciência para defender o preconceito do homem comum contra a ciência. Algo muito similar se aplica a Spengler. Com os instrumentos da metafísica, defendeu da oposição crítica da metafísica o culto positivista dos fatos, sua flexibilidade ao “dado”. Um segundo Comte, ele transformou o positivismo em uma metafísica própria, a submissão aos fatos existentes em um amor fati, nadando com a correnteza em “tato cósmico” e a abnegação da verdade na verdade em si. Daí deriva sua força.

Spengler se posiciona, junto com Klages, Moeller van den Bruck, e também Jünger e Steding, entre aqueles teóricos de reação extrema cuja crítica ao liberalismo se provou superior em muitos aspectos àquela que veio da esquerda.

É valoroso estudar as causas dessa superioridade. Isso provavelmente se deve a uma atitude diferente em relação ao complexo da "ideologia". Os partidários do materialismo dialético viram a ideologia liberal, que amplamente criticaram, como uma falsa premissa. Eles não desafiaram as ideias de humanidade, de liberdade, de justiça enquanto tal, mas meramente negaram a reivindicação de nossa sociedade ter de representar a percepção dessas ideias.

Embora tratassem as ideologias como ilusões, elas ainda as consideravam ilusões da própria verdade. Isso conferiu um esplendor conciliatório, se não ao existente, pelo menos às suas “tendências objetivas”. Sua doutrina do acréscimo dos antagonismos sociais, ou suas declarações sobre a potencial recaída no barbarismo, foram dificilmente levadas a sério.

As ideologias foram desmascaradas como disfarces apologéticos. Elas raramente eram concebidas como instrumentos poderosos, funcionando para transformar a sociedade liberal competitiva em um sistema de opressão imediata. Assim a questão de como o existente pode possivelmente ser mudado por aqueles que são suas próprias vítimas, psicologicamente mutiladas por seu impacto, raramente foi colocada, exceto pelos dialéticos da tradição hegeliana, tal como Georg von Lukács.

Conceitos tais como aquele das massas ou da cultura foram amplamente excluídos da crítica dialética. Ninguém se importou muito sobre como eles estavam envolvidos dentro do processo total de nossa sociedade. Não houve a percepção de que as massas, no sentido específico do termo, não são meramente a maioria dos trabalhadores explorados, mas que suas características enquanto “massas” são elas mesmas marcadas pela atual fase da sociedade de classes.

Não houve também o reconhecimento da extensão em que a cultura está mudando para um sistema regulativo de dominação de classe. Acima de tudo os críticos esquerdistas fracassaram em notar que as “ideias” em si mesmas, em sua forma abstrata, não eram meramente imagens da verdade que se materializará posteriormente, mas que elas estão debilitadas em si, afligidas com a mesma injustiça sob a qual elas são concebidas e ligadas ao mundo contra o qual foram estabelecidos.

À direita, era mais fácil enxergar através das ideologias quanto mais desinteressado estivesse na verdade que essas ideologias continham, por mais falsa que fosse sua forma. Todos os críticos reacionários seguiram Nietzsche na medida em que eles consideravam a liberdade, a humanidade e a justiça como nada mais do que uma fraude inventada pelo fraco como uma proteção contra o forte. Como defensores do forte, podem facilmente pontuar a contradição entre essas ideias—debilitadas como elas necessariamente são—e a realidade.

Sua crítica às ideologias é confortável. Consiste principalmente em mudar da percepção de uma realidade ruim para uma percepção de ideias ruins, esta última supostamente comprovada porque essas ideias não se tornaram realidade. O momento inerente nessa crítica barata é marcado por seu firme vínculo do entendimento com os poderes constituídos.

Spengler e seus iguais são menos profetas do curso do espírito do mundo do que seus agentes devotos. A própria forma de prognóstico praticada por Spengler implica uma mobilização administrativa do homem que os coloca fora de ação. As teorias contra as quais ele se enfurece não são, a rigor, proféticas.

Para eles a história não é uma interação de “relações de poder” políticas; eles buscam colocar um fim racional a essa cega interação idêntica de poderes. Esperam tudo do homem e sua ação, mas não os organizam, classificam e imaginam o que acontecerá.

A última atitude é um índice da própria reificação do homem, que eles lutam para superar, e Spengler enfatiza essa atitude. Ele insiste que o que importa para o verdadeiro historiador é calcular o maior número possível de quantidades desconhecidas. Mas não se pode calcular o desconhecido da humanidade. A história não é uma equação. Não é um juízo analítico em geral. Concebê-la como tal exclui a priori a potencialidade da novidade, em torno da qual todo o materialismo dialético está centrado.

Por outro lado, a previsão de Spengler de que a história sempre se repetirá nos lembra os mitos de Tântalo e Sísifo e as respostas oraculares que sempre pressagiam o mal. Ele é um narrador de fortuna ao invés de um profeta. Em sua gigantesca e destrutiva predição do futuro, o pequeno burguês celebra seu triunfo intelectual.

A morfologia da história universal serve à mesma necessidade da grafologia na denúncia de Klages sobre a consciência. O desejo malicioso do pequeno burguês de ler o futuro a partir da caligrafia, do passado ou das cartas implica a mesma coisa pela qual Spengler culpa rancorosamente as vítimas: a renúncia da autodeterminação consciente. Spengler se identifica com o poder, mas sua teoria revela a impotência dessa identificação por meio de sua atitude de predição do futuro. Ele está tão seguro de seu caso quanto o carrasco depois que os juízes dão o veredicto. A fórmula do mundo histórico-filosófica imortaliza sua própria impotência, assim como a dos outros.

Essa caracterização da forma na qual Spengler pensa pode permitir algumas das considerações críticas mais fundamentais. Tentamos elaborar as características positivistas de sua metafísica, sua resignação com aquilo que é o que é e nada mais, sua eliminação da categoria de potencialidade e seu ódio a qualquer pensamento que leve a sério o possível em relação ao real.

Em um ponto decisivo, entretanto, Spengler suspendeu seu positivismo—tanto que alguns de seus críticos teológicos se sentem no direito de reivindicá-lo como aliado. Esse ponto ocorre quando fala do poder movente dentro da história que ele via como o “Seelentum” (almanidade), a qualidade enigmática, porém totalmente interna, de um tipo especial de homem que, de forma bastante irracional, às vezes entra na história.

Incidentalmente, Spengler chama algumas vezes essa qualidade de “raça”, embora seu conceito de raça não tenha nada a ver com aquele dos Nacional-Socialistas; não se pertence a uma raça, uma vez declarou, tem-se raça.

Apesar de toda sua ênfase nos “fatos” e todo o seu relativismo cético, Spengler hipostasia a doutrina das almas culturais como um princípio metafísico que serve como a explicação última da dinâmica histórica. Ele afirma frequentemente que isso é relacionado de forma próxima ao conceito de enteléquia de Leibniz e Goethe, “geprägte Form, die lebend sich entwickelt. [“Forma moldada que se desenvolve enquanto vive”]” Essa metafísica de uma alma coletiva que, como uma planta, se desenvolve e morre, faz de Spengler um vizinho da Lebensphilosophen, Nietzsche, Simmel e particularmente Bergson a quem ele estigmatiza de forma mais implacável.

É fácil ver por que a conversa sobre alma e vida se encaixa na tática de Spengler. Isso permite que ele chame o materialismo de superficial quando, na verdade, ele se opõe a ele apenas porque não é positivista o suficiente para ele, pois os materialistas querem que o mundo seja diferente do que é.

Ainda sim a metafísica da humanidade tem mais do que importância meramente tática dentro da doutrina de Spengler. Podemos chamá-la de filosofia oculta de identidade. Com um pouco de exagero pode-se também dizer que para Spengler a história do mundo torna-se uma história do “estilo”.

Ele considera as experiências históricas da humanidade, seja tanto o produto do interior dos homens quanto as obras de arte. O homem de fatos nesse caso fracassa em reconhecer a parte desempenhada ao longo da história por necessidades materiais. A relação entre o homem e a natureza, que engendra a tendência do homem para dominar a natureza, reproduz a si na dominação do outro homem pelo homem. Isso dificilmente é percebido em The Decline of the West.

Spengler não vê até que ponto o destino histórico glorificado por sua abordagem resulta da interação humana com a natureza. A imagem da história se torna completamente estética para ele. A economia é um “mundo da forma” precisamente como a arte; uma esfera que é a expressão pura da alma específica de uma cultura, essencialmente independente do desiderato envolvido na reprodução da vida material.

Não é por acaso que Spengler se torna impotente e diletante sempre que aborda problemas econômicos. Ele discute a onipotência do dinheiro na maneira de um agitador sectário denunciado a conspiração mundial dos banqueiros. Fracassa em perceber que os meios de troca nunca determinam a estrutura subjacente de uma economia, e fica tão fascinado pela fachada do dinheiro, pelo que ele chama de “poder simbólico”, que confunde o símbolo com a própria substância.

Ele não se intimida com declarações como a de que o objetivo do movimento dos trabalhadores “não é superar os valores monetários, mas possuí-los[25]”. Como categorias, a economia de escravo, o proletariado industrial, a técnica de máquinas não são para ele fundamentalmente diferentes das artes plásticas, da música polifónica ou do cálculo infinitesimal.

Realidades econômicas dissolvem-se em meras marcas de uma entidade interna. Embora as conexões cruzadas assim criadas entre as categorias de realidade e simbolismo muitas vezes lançam uma luz surpreendente sobre a unidade das épocas históricas, elas levam a afirmações completamente equivocadas sobre tudo o que não se origina livre e autonomamente do poder da expressão humana. O que não pode ser reduzido, como um símbolo, à natureza humana soberana, sobrevive em Spengler apenas em vagas referências à interconexões cósmicas.

Assim, o determinismo da concepção de história de Spengler parece gerar um segundo domínio de liberdade. Mas isso só parece acontecer. Uma constelação mais paradoxal surge: tudo que é externo vem a ser uma imagem do interno, e nenhum processo real ocorre entre sujeito e objeto na filosofia da história de Spengler. Seu mundo surge  organicamente da substância da alma, como uma planta de uma semente.

Sendo reduzida à essência da alma, a história ganha um aspecto orgânico ininterrupto, fechado dentro de si mesma. Dessa maneira, no entanto, torna-se até mais determinística. Joel declara em seu artigo na edição de Spengler da Logos que “toda a doença desse livro significante é que esqueceu-se do homem com sua produtividade e liberdade. Apesar de toda a interiorização, ele desumaniza a história e a transforma em uma sequência de processos naturais típicos. Apesar de toda a animação (Durchseelung), ele transforma a história em algo corpóreo (verleiblicht), visando a sua ‘morfologia’ ou ‘fisionomia’ e, desse modo à uma comparação de suas aparências externas, suas formas de expressão, as características particulares de seu fenômeno.”[26]

A história, entretanto, é desumanizada não “apesar de toda interiorização” mas por meio dela. A filosofia de Spengler desdenhosamente deixa de lado a natureza com a qual os homens têm que lutar na história. Ao invés dessa luta, a história em si torna-se uma segunda natureza tão cega e destinada quanto a vida vegetal.

O que podemos chamar de liberdade do homem consiste somente na tentativa humana de quebrar a regra imposta pela natureza. Se isso é ignorado e o mundo histórico é transformado em um mero produto da essência humana, a liberdade será perdida na resultante humanidade universal (Allmenschlichkeit) da história. A liberdade só se desenvolve por meio da resistência do mundo natural ao homem. A liberdade postula a existência de algo não-idêntico. Assim que ela se torna absoluta e a sua essência, a alma, é elevada ao princípio governante do mundo todo, esse princípio idêntico é vítima da mera existência.

A arrogância idealista da concepção da história de Spengler e a degradação do homem implícita nela são, na verdade, uma e a mesma coisa. Cultura não é, como para Spengler, a vida de almas coletivas desenvolvendo a si, mas são ao invés disso a luta dos homens pelas condições de sua perpetuação.

Cultura contém, assim, um elemento de resistência à necessidade cega: a vontade pela autodeterminação através da Razão. Spengler separa a cultura do desejo de sobreviver da humanidade. A cultura vem a ser, para ele, um jogo da alma consigo mesma. A resistência é eliminada. Assim seu próprio idealismo se torna subserviente à sua filosofia do poder.

A cultura se encaixa perfeitamente no reino da dominação cega. O processo autossuficiente que se origina da mera interioridade e termina em mera interioridade se torna o Destino, e a história se decompõe naquele sobe e desce sem objetivo das culturas, naquela atemporalidade que Spengler culpa as civilizações tardias e que, na verdade, constituem o núcleo de seu próprio plano mundial. A alma pura e a dominação pura coincidem, pois a alma spengleriana domina violenta e impiedosamente seus próprios ouvintes. A história real é ideologicamente transfigurada em uma história da alma apenas para que as características resistentes e rebeldes do homem, sua consciência, possam ser subordinadas de forma mais completa à necessidade cega.

Spengler mais uma vez revela a afinidade entre o idealismo absoluto - sua doutrina da alma aponta de volta para Schelling—e a mitologia demoníaca. Sua inclinação pelas vias mitológicas de pensar pode ser compreendida em certos pontos extremos. Os intervalos de tempo regulares em diferentes culturas, a periodicidade dos eventos de um certo significado “é mais um indício de que as Projeções Cósmicas na forma de vidas humanas na superfície de uma estrela menor não são autocontidas e independentes, mas estão em profunda harmonia com o movimento interminável do universo. Em um pequeno mas notável livro, R. Mewes, Die Kriegs und Geistesperioden im Völkerleben und Verkündung des nächsten Weltkrieges (1896), a relação desses períodos de guerra com os períodos climáticos, ciclos de manchas solares e certas conjunturas dos planetas foi estabelecida, e uma grande guerra foi prevista para o período de 1910-20. Mas essas e muitas outras conexões semelhantes que estão ao alcance de nossos sentidos... ocultam um segredo que precisamos respeitar.”[27] Com toda a sua ridicularização dos místicos civilizados, Spengler, com tais formulações, fica próximo da superstição astrológica. Assim termina a glorificação da alma.

A recorrência de todo padrão idêntico, entretanto, no qual tal doutrina do destino termina, é nada mais do que a reprodução perpétua da ofensa do homem contra o homem. O conceito de destino que sujeita o homem à dominação cega reflete a dominação exercida pelos próprios homens. Quando quer que Spengler fala de destino, ele está lidando com a subjugação de um grupo de homens por outro.

A metafísica da alma complementa seu positivismo a fim de hipostasiar como eterno e inescapável o princípio de uma regra implacável de perpetuação. De fato, no entanto, a inescapabilidade do destino é definida através da dominação e da injustiça. Spengler traz a justiça como o contra-conceito ruim do destino, o sublime na história.

Em uma das suas passagens mais brutais de seu trabalho, ele se queixa que o “sentimento de mundo da raça; o instinto político (e portanto nacional) pelo fato (‘meu país, certo ou errado!’); resolve ser o sujeito e não o objeto da evolução (para um ou outro, tem que ser)—em um mundo, a vontade de poder—tem que recuar e abrir espaço para uma tendência cujos porta-padrões são, na maioria das vezes, homens sem impulso original, mas ainda mais determinados em sua lógica; homens em casa em um mundo de verdades, ideais, e Utopias; homens de livros que acreditam que podem substituir o real pelo lógico, o poder dos fatos por uma justiça abstrata, o Destino pela Razão. Começa-se com os eternamente temerosos que se retiram da realidade para celas, câmaras de estudo e comunidades espirituais, e proclamam a nulidade dos feitos do mundo, e termina em toda cultura com os apóstolos da paz mundial. Todo povo tem esses produtos residuais (historicamente falando). Até mesmo seus chefes constituem, fisionomicamente, um grupo por si mesmos. Na ‘história do intelecto’ eles se destacam - e muitos nomes ilustres são contados entre eles -, mas considerado de um ponto de vista da história real, eles são ineficientes.”[28]

Depois disso, a oposição de Spengler significa a superação historicamente do “ponto de vista da história atual”; isso significaria perceber que é historicamente possível o que Spengler chama de impossível apenas porque ainda não foi realizado. Em termos sóbrios e ainda com profundo entendimento a crítica de James Shotwell chega ao centro da questão: “No passado, o inverno seguia o outono porque a vida era repetitiva e se passava em áreas limitadas de economia autônoma. O intercâmbio entre as sociedades era mais predatório do que estimulante, porque a humanidade ainda não havia descoberto os meios de manter a cultura, sem uma dependência injusta daqueles que não tinham participação em suas bênçãos materiais.

Desde a invasão selvagem e a escravidão até os problemas industriais de hoje, as civilizações recorrentes foram, em grande parte, construídas sobre falsas forças econômicas, apoiadas por casuísmos morais e religiosos igualmente falsos. As civilizações que surgiram e desapareceram carecem inerentemente de equilíbrio porque foram construídas com base na injustiça da exploração. Não há razão para supor que a civilização moderna deve, inevitavelmente, repetir esse rítmo cataclísmico.”[29]

Essa compreensão é capaz de despedaçar todo o conceito de história de Spengler. Se a queda da antiguidade foi ditada pela necessidade autônoma da vida e pela expressão de sua “alma”, então, de fato, ela assume o aspecto de fatalidade e, por analogia, esse aspecto é transferido para a situação atual. Se, no entanto, como está implícito na declaração de Shotwell, a queda da antiguidade pode ser entendida por seu sistema improdutivo de latifúndios e pela economia de escravos relacionada a ele, a fatalidade pode ser dominada se os homens conseguirem superar essas e outras estruturas semelhantes de dominação. Em tal caso, a estrutura universal de Spengler revela a si mesma como uma falsa analogia extraída de um acontecimento solitário ruim—solitário apesar de sua recorrência ameaçadora.

Isso, no entanto, envolve mais do que uma crença no progresso contínuo e a sobrevivência da cultura. Spengler enfatizou a natureza crua da cultura, e com uma ênfase que deveria, de uma vez por todas, abalar a confiança ingênua em seu efeito conciliador. Mais notavelmente do que quase qualquer outro, ele demonstrou como essa crueza da cultura a leva repetidamente à decadência e como, como forma e ordem, a cultura está afiliada àquela dominação cega que, por meio de crises permanentes, está sempre propensa a aniquilar a si mesma e a suas vítimas.

A essência da cultura produz a marca da Morte—negar isso seria fraco e sentimental, dado a teoria de Spengler que revelou tantos dos segredos da cultura quanto Hitler daqueles da propaganda. Não existe chance de evadir o círculo mágico da morfologia de Spengler difamando a barbárie e confiando na saúde da cultura. Qualquer otimismo franco do tipo é proscrito pela situação presente. Ao invés disso, devemos nos tornarmos conscientes do elemento do barbarismo inerente à própria cultura. Somente as considerações que desafiam a ideia de cultura, assim como desafiam a realidade da barbárie, têm a chance de sobreviver ao veredito de Spengler. A alma da cultura assim como a planta, o vital “estar na forma”, o mundo inconsciente dos símbolos, cujo poder expressivo o intoxica—todas essas marcas da vida triunfante são mensageiras da desgraça onde quer que se manifestem de fato. Pois todos eles são testemunhas da coerção e do sacrifício que a cultura impõe ao homem. Confiar neles e negar a desgraça iminente significa apenas se enredar ainda mais profundamente em sua selva mortal.]

Spengler tem o olhar curioso do caçador que atravessa impiedosamente as cidades da humanidade como se elas fossem as selvagens que de fato são. Mas uma coisa escapou de seu olhar: as forças liberadas pela decadência. “Como é que tudo o que é para ele parece tão doente?” (“Wie scheint doch alles Werdende so krank”)—a sentença do poeta Georg Trakl transcende a paisagem de Spengler.

Há uma passagem no primeiro volume de Decline of the West que foi omitida na tradução em inglês. Refere-se à Nietzsche. “Ele usou a palavra decadência. Neste livro, o termo Declínio do Ocidente significa a mesma coisa, só mais compreensível, ampliada do caso que temos hoje para um tipo de época histórica geral, e observada do ponto de um pássaro de uma filosofia do Devir.”[30]

No mundo da violência e da vida opressiva, essa decadência é o refúgio de uma melhor potencialidade por virtude do fato de que se recusa a obediência deste vida, sua cultura, sua pureza e sublimidade.

De acordo com Spengler, aqueles que a história vai deixar de lado e aniquilar personificam negativamente dentro da negatividade dessa cultura aquilo que promete, ainda que fracamente, quebrar a esfera da cultura e acabar com o horror da pré-história. Seu protesto é nossa única esperança de que o destino e a força não terá a última palavra. Isso que se posiciona contra o declínio do ocidente não é a cultura sobrevivente mas a Utopia que é incorporada silenciosamente na imagem do declínio.

 

Notas

[1] Referimos-nos a tradução feita por Charles Francis Atkinson, Vol. 1, New York 1926; Vol. 2, New York 1928.

 [2] N. do T. : “Almanidade” é um pretenso “neologismo” escolhido pelo tradutor deste texto para indicar a palavra alemã Seelentum”. A palavra correspondente na língua inglesa - esta que foi escolhida por Adorno - é “souldom”.

[3] II, p.100.

[4] II, 102.

[5] II, 103.

[6] N. do T. :“Fellah” se refere a um camponês, um fazendeiro e um aldeão. No entanto, de forma distinta dos “Effendi”, não são proprietários de terras.

[7] I, 35.

[8] II, 461.

[9] II, 462.

[10] II, 462.

[11]II, 462.

[12]II, 462 f.

[13]II, 429.

[14]cf. F. Pollock, "State Capitalism", nesta questão.

[15]II, 432.

[16]II, 450.

[17] II, 457, nota 2.

[18] II, 454.

[19] II, 454.

[20] II, 47.

[21] De Essays in Intellectual History, Nova Iorque e Londres, 1929, p. 62.

[22] cf. Karl Joel, "Die Philosophie in Spenglers 'Untergang des Abendlandes'" in Logos, Vol. IX, p. 140.

 [23] Pode-se notar o que Guillaume Apollinaire escreveu na França Le poète assassiné elaborando precisamente a mesma tese por meio do abalo surrealista. Pode-se com segurança assumir que o nacionalista Alemão e o escritor da vanguarda radical Francesa não se conheciam. Ambos insistem que escreveram seus livros antes da guerra mundial.

[24] II,368

[25] II,506.

[26] Karl Joel, loc. Cit.., ibid

 [27] II, 392, nota 1.

[28] II,I86

[29] loc. cit. p. 66f.

 [30] 4th edição, Munique 1919, I, p. 394.

 

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